sábado, 4 de janeiro de 2014

Olha o velhinho!

Eu e Claudia, minha esposa, somos bem diferentes. Esse é um dos aspectos que me atrai nela.

Costumo dizer que a síntese de nossas personalidades pode ser ilustrada em uma fila de espera. Em um banco, por exemplo. Vou para ela com um livro e saio dela com algumas páginas lidas. Claudia não. Ela vai sozinha para a fila. Mas, ao deixá-la, conversou com todo mundo, brincou com vários, contou piadas, trocou cartões, fez amizades. Assim é Claudia.

Claudia invariavelmente está de bom humor. Sempre está disposta a encontrar motivo de riso em qualquer circunstância. Procura ver algum aspecto positivo mesmo nas piores situações.

Final de ano, fomos ao supermercado. Se pudesse não iria. Prefiro a tranquilidade de minha casa, assistindo TV ou lendo um livro. Nesse dia não foi possível.

Como era de se esperar, parece que a cidade toda estava fazendo compras. E aí, os inevitáveis choques entre carrinhos, os esbarrões com a multidão, as latas caindo das prateleiras, os funcionários correndo de um lado para outro...

Estamos na seção de hortifrúti. Enquanto fico estacionado em um canto, cuidando do carrinho, com cara de paisagem, Claudia percorre com desenvoltura os corredores escolhendo um alface aqui, pegando umas batatas ali, lembrando das bananas que estão na outra banca.

Quando Claudia vem a mim trazendo vários produtos, ouvimos uma voz perguntando se o carrinho é nosso. Ao nos voltarmos vemos um rapaz que aponta para um carrinho vazio ao lado. Estranho.

Estranho um rapaz fazendo compras sozinho. Isso acontece, mas é incomum. Talvez ele esteja ali por obrigação, mesmo constrangido, não acostumado àquela bagunça. Estranho um carrinho abandonado, sozinho. Estará disponível? Ou então alguém o deixou no canto para fazer compras para em seguida colocá-las nele?

Quando eu ia responder a pergunta, racionalizando sobre as possibilidades do carrinho estar livre ou esperando seu dono, Claudia foi mais rápida. Com seu senso de humor, comenta: - está livre ou é de algum velhinho? - Acho que está livre.

O rapaz, meio indeciso, pega o carrinho, não sem antes dar uma olhada ao redor para se garantir, e sai. Quando dá os primeiros passos, dando as costas para nós, Claudia dispara: - Olha o velhinho!

O moço abaixa a cabeça e acelera o passo, temeroso de ser pego em flagrante.

Olho para Claudia e ela está rindo aos montes.

Essa é a minha esposa.

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