segunda-feira, 30 de março de 2015

Mãos

São Paulo...

final de tarde...

metrô.

Entro no vagão.

Eu e uma multidão. Vamos espremidos. Como descerei logo, fico voltado para a porta, olhando o concreto escuro e informe que passa rapidamente diante de mim.

Entre um empurrão e outro, uma espremida e outra, vejo deslizarem ao meu lado duas mãos que, ao se alongarem, procuram apoio na porta do vagão. Os corpos ficam para trás. Não consigo vê-los. Apenas as mãos que se projetam ao meu lado e se fixam na porta para manter os corpos equilibrados.
Olho para braços e mãos. Mais para as mãos.

Uma é de uma senhora. A mão é menor, os dedos são delicados. A outra é maior, dedos mais largos. Mão de homem. Mãos que, embora de sexos diferentes, se associam em características comuns. Ambas estão ressecadas, ásperas. A mulher tem as unhas curtas e sem esmalte.

Certamente são mãos que convivem com a louça suja, com roupas por lavar, com a faxina de casa e com o peso da sacola que leva arroz, feijão, macarrão, fubá e outros alimentos básicos que, na falta de um carro, precisam ser carregados do supermercado ou da venda para casa em uma caminhada penosa.

São mãos acostumadas com tijolos, cimento, enxada, escadas e instrumentos que a calejam, fortalecem seus tendões, engrossam sua pele. Mãos que constroem a vida de outros e dão sustento à sua própria.

Mãos que agora precisam aprender a equilibrar o corpo na dança sinuosa do vagão do metrô.

Lembro das mãos de meu pai em minha infância. Mãos gigantes para uma criança. Mãos morenas, de uma pele que, me explicavam, descendia de bugres. Mãos que seguravam minha pequena mão. Mãos que tempos depois apertavam a minha em um cumprimento orgulhoso entre homens. Mãos que nos últimos tempos estavam pálidas por falta de oxigênio.

Mãos que nos alimentavam e nos vestiam. Mãos que lavavam, costuravam, que limpavam a casa e nossos corpos. Mãos que faziam afagos. Mãos multitarefas em uma vida multifacetada. Mãos de minha mãe.

Mãos de Claudia. Que conheço tão bem. Há décadas. Geografia que mapeio, caminhos do coração. Mãos generosas, que expressam concretamente o bem e o amor que habitam seu ser. Mãos que, quando não há nada a ser dito, quando as palavras não são suficientes, ao apertar minha mão dizem tudo.

A porta abre. Desço rapidamente sem tempo de buscar os corpos, as faces, o senhor e a senhora das mãos que contemplava. Mãos que equilibram corpos, mãos que equilibram a vida. Mãos que me lembram de outras mãos, que equilibraram e equilibram minha vida.

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